A obesidade infantil é uma doença de consequências graves que se instala em múltiplos órgãos. Excesso de gordura corpórea na infância é causa de diabetes, hipertensão, elevação dos níveis de colesterol e triglicérides, tendência à coagulação acelerada do sangue, alterações na parede interna dos vasos e maior produção de insulina. A predisposição genética para a obesidade é um fenômeno biológico de alta complexidade, que envolve interações de mais de 250 genes diferentes. Além da genética, fatores pré-
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Dois estudos demonstraram que bebês amamentados com mamadeira correm mais risco de desenvolver obesidade no futuro. A explicação pode estar relacionada à existência de algum componente protetor presente apenas no leite materno, à preferência pelo paladar
ou à interferência de mecanismos psicológicos no centro de saciedade do bebê.
O índice de massa corpórea (peso dividido pela altura ao quadrado) diminui do nascimento até os cinco ou seis anos de idade, para depois aumentar gradualmente até a adolescência. Quando fatores ambientais, como falta de atividade física e dietas de alto conteúdo calórico, provocam aumento de peso que subverte essa regra geral, surge predisposição à obesidade
na vida adulta.
A falta de atividade física da criança urbana de hoje é considerada pelos especialistas uma das principais causas da epidemia de obesidade infantil que se dissemina em diversos países, inclusive no nosso. Um trabalho realizado na Cidade do México mostrou que
o risco de obesidade caiu 10% para cada hora de atividade física de intensidade moderada ou forte praticada diariamente pela criança. Estudo semelhante conduzido na Carolina do Sul chegou à mesma conclusão: crianças mais ativas são mais magras do que aquelas que
se movimentam pouco.
O número de horas que a criança passa diante da TV, entretida com programas infantis ou videogames, está diretamente ligado ao aumento de peso. O trabalho realizado na Cidade do México encontrou um aumento de 12% no risco de desenvolver obesidade para cada hora por dia na frente da TV. Os autores concluíram que a TV aumenta o risco de obesidade não só por desviar a criança das atividades físicas, mas por induzir à ingestão de alimentos altamente calóricos.
Pesquisadores americanos e ingleses contaram o número de comerciais na televisão que anunciam doces, balas, chocolates, refrigerantes, biscoitos e outros alimentos de conteúdo energético alto e chegaram à conclusão de que, nos seus países, cada criança fica exposta a dez desses comerciais por hora. Outro trabalho comprovou que crianças de três a cinco anos submetidas a esse bombardeio diário dos anunciantes costumam escolher as guloseimas apregoadas na TV, quando são oferecidas como opção frutas e outros alimentos saudáveis.
Neste momento, há grande discussão na literatura médica a respeito da composição ideal da dieta pediátrica. Nos últimos 30 anos, o consumo de gordura animal tem sido diretamente responsabilizado não só pelo aumento de peso entre os adultos como pela atual epidemia de crianças obesas. A ideia parece ter lógica porque as gorduras são alimentos de alta densidade energética: um grama de gordura produz nove calorias, enquanto um grama de açúcar ou proteína produz quatro calorias.
Os dados epidemiológicos, no entanto, falharam sistematicamente na comprovação dessas teorias em crianças e adolescentes – e também nos adultos. Ao contrário, a epidemia de obesidade pediátrica se disseminou nos Estados Unidos apesar da redução do conteúdo de gordura na dieta das crianças americanas ocorrida nos últimos 20 anos.
A diminuição do número de calorias derivadas de gordura animal na dieta costuma ser compensada por um aumento significante do consumo de carboidratos pelas crianças: pães, doces, chocolates, refrigerantes, salgadinhos e batata frita passaram a ser ingeridos em
quantidades sem precedentes na história da humanidade.
Esses alimentos de alto índice glicêmico provocam súbitos aumentos pós-prandiais da concentração de moléculas de glicose na corrente sanguínea. Em resposta, o pâncreas
secreta quantidades elevadas de insulina para quebrar essas moléculas e armazená-las sob a forma de glicogênio. Armazenadas, as moléculas de açúcar desaparecem da circulação,
e o centro da fome é ativado novamente.
Esse mecanismo biológico explica por que, três horas depois do almoço farto em carboidratos do domingo, assaltamos a geladeira famintos atrás do pedaço de pudim que sobrou.
A prevenção à obesidade é de extrema importância para o desenvolvimento da criança. Chegar à vida adulta com excesso de gordura no corpo, além de aumentar o risco de várias
doenças, dá início a uma batalha sem fim contra a balança. Uma afirmação de consenso dos National Institutes of Health, dos Estados Unidos, ilustra como pode ser inglória essa
luta: “Adultos que participam de programas de emagrecimento podem esperar uma perda de apenas 10% do peso corpóreo, no máximo. Cerca de 50% dessa perda são repostos em um ano, e, virtualmente, todo o resto é recuperado em cinco anos”.
Fonte: Drauzio Varella
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